DEMITA SEUS GURUS / MESTRES – GRANDE REFLEXÃO!!
“É hora de acabar com a dependência e nos
tornarmos tão grandes quanto os mestres que seguimos – tão autênticos,
peculiares e obstinados quanto eles.” por Tijn Touber
“Todo homem deve chegar aos céus à sua própria maneira”
Frederico II (1712-1786), rei da Prússia
“Todo homem deve chegar aos céus à sua própria maneira”
Frederico II (1712-1786), rei da Prússia
"Um bom Mestre faz com que as pessoas acreditem nele.Um verdadeiro Mestre faz com que as pessoas acreditem Nelas.OS MAIORES DOS MESTRES SÃO MÃE MARIA E JESUS CRISTO!"
"O essencial é que vos torneis livres e fortes e não o podereis fazer se tendes mediadores acima de vós. Não podeis ser livres e fortes se me tomardes para Mestre. Não é isso o que eu quero e sim tornar-vos fortes e livres não pelo êxtase, mas por uam reflexão atenta e deliberada, após uma longa pesquisa. Só esta certeza interior poderá destruir em vós todas as deformações do irreal"
"Eu nego que a verdade possa achar-se através dos outros, por muito maravilhosas que sejam tais pessoas e as suas organizações. A totalidade absoluta não pode ser realizada senão pelo vosso esforço pessoal".
"Observei pessoas que levavam uma vida regrada, que se levantavam a horas certas, que se alimentavam de acordo com a maneira prescrita por um pretenso ser espiritual, e que não pensavam aquelas coisas que que lhes foram proibidas. Eu as observei e vi que faltava aquilo que traz a frescura da vida. Não é impondo-se limites, observando de maneira ininteligente e estreita disciplinas mesquinhas, que se atinge o fim. A Verdade é independente do que comeis, da maneira pela qual meditais e do caminho que seguis para alcançar a compreensão."
"As religiões são obstáculo ao entendimento e a Verdade é um país sem caminhos".
"Eu segui o santuário que vós seguis, com as vossas mediações e cerimônias. E como passei por todas essas coisas eu vos digo: - deixai-as de lado! Como sofri e também fui cativo eu vos digo: - deixai essas coisas de lado, elas não auxiliam. A Verdade é uma terra sem caminhos, porque ela é o Todo".
Jiddu Krishnamurti
Omraam
Mikhael Aïvanhov
(1900 - 1986)
(1900 - 1986)
COMO RECONHECER UM VERDADEIRO
MESTRE ESPIRITUAL
por: Omraam
Mikhael Aïvanhov
Mestre espiritualista
búlgaro,
que morou a maior parte de sua vida na França. |
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Para alguns discípulos,
encontrar o seu Mestre é encontrar uma mãe que aceita trazê-lo nove meses no
ventre para fazê-lo nascer no mundo espiritual. E, depois de nascer, isto é,
desperto, os seus olhos descobrem a beleza da Criação, os seus ouvidos ouvem
a palavra divina, a sua boca saboreia alimentos celestes, os seus pés
levam-no aos diferentes lugares do espaço para fazer o bem e as suas mãos
aprendem a criar no mundo sutil da alma.
Muito poucas pessoas sabem o
que é realmente um Mestre. Algumas leram livros que contam histórias
inverossímeis: que um Mestre é perfeito, onisciente, onipotente.... que ele
não tem necessidade de comer, nem de beber, nem de dormir...que ele está ao
abrigo de todas as tentações e, sobretudo, que passa o seu tempo a fazer
milagres, como no livro de Spalding: "A Vida dos Mestres".
Quantas pessoas não ficaram
exultantes com este livro sem suspeitarem de que contém imensas histórias sem
fundamento. É verdade que os grandes Mestres têm poderes excepcionais, mas
não os utilizam para fazer prodígios diante de gente embasbacada. Aparecer e
desaparecer, caminhar sobre as águas, voar no espaço, materializar festins,
atravessar as chamas de um incêndio, fazer aparecer casas... mesmo que seja
capaz de fazê-lo, um verdadeiro Mestre não o fará, pois assistir a tais
espetáculos não ajuda os humanos a transformarem-se...
Um Mestre - é necessário que
você o saiba - é feito como todos os outros homens: tem os mesmos órgãos, que
o fazem sentir as mesmas necessidades e os mesmos desejos.
E se lhe cortar um pedaço de carne, verá que seu sangue correrá e que a sua
cor é vermelha como o de toda a gente! A diferença está em que a consciência
de um Mestre é muito mais vasta do que a da maioria dos homens: ele tem um
ideal, pontos de vista superiores e, sobretudo, conseguiu um perfeito domínio
sobre si próprio. Evidentemente, para tal é necessário imenso tempo e um
trabalho gigantesco, e por isso ninguém pode tornar-se Mestre numa só
encarnação.
Se você encontrar um Mestre,
tenha consciência de que todas as qualidades e virtudes que ele manifesta não
foram adquiridas apenas nesta vida.
Não, ele teve que trabalhar
durante séculos, milênios até, e, como as qualidades que adquirimos pelo
nosso próprio trabalho não desaparecem no momento em que temos de deixar a
terra, quando regressa ele traz de novo essas qualidades. Assim, de
encarnação em encarnação, ele vai adquirindo sempre novos elementos
espirituais até ao dia em que torna-se um verdadeiro condutor da luz e das
virtudes divinas.
Infelizmente, há também seres
que se preparam durante séculos para se tornarem condutores do mal; são os
mestres da magia negra.
O ser humano é livre de
escolher o bem e o mal. É claro que, quando escolhe o mal, mesmo que a
Inteligência Cósmica o deixe continuar durante um certo tempo, ele acabará
sempre por ser aniquilado, dado que, pelo seu comportamento, se opõe à ordem
universal.
Mas, à partida,o ser humano tem
a hipótese de escolher. Enquanto vivo, é livre de se determinar num sentido
ou no outro.
Alguns seres, muito raros,
apesar desta liberdade que lhes é concedida, permanecem definitivamente
determinados. Os grandes Iniciados, por exemplo, determinaram-se para a
luz e para o amor. Alguns, é certo, caíram, mas a maioria deles permaneceram
espíritos de luz. E, aliás, quanto mais tempo passa, menor é a
possibilidade de mudarem de direção,pois, graças ao seu trabalho espiritual,
eles foram conseguindo transformar, divinizar, a matéria do seu corpo e esta
tornou-se como que um metal inoxidável, ouro puro.
Contudo, enquanto um ser não
chega a este estado de evolução, é sempre possível ele mudar de direção, e
existem casos na História em que magos brancos tornaram-se magos negros.
Pergunte como é possível alguém
tornar-se um mago negro... Na realidade, é muito fácil, mesmo para você:
basta dar vazão à sua natureza inferior.
Se transgredir continuamente as
leis da bondade, da justiça e do amor, tentando obter êxito à custa dos
outros, tentando derrotá-los, destruí-los, só poderá tornar-se um mago negro.
É simples, é claro. Muitos imaginam que, para alguém se tornar um mago
negro, é necessário que um mestre diabólico lhe ensine a arte dos
encantamentos e dos esconjuros maléficos. Isso pode acontecer, mas, para
alguém colocar-se ao serviço do mal, não é absolutamente necessário ter um
mestre; sem instrutor, sem receita, sem nada, qualquer um pode tornar-se
um mago negro se deixar-se guiar demasiado pela sua natureza inferior. E
o mesmo se passa com um homem que só pense em ajudar e em esclarecer os
outros: mesmo que não tenha um Mestre para o instruir, estará a caminho de
tornar-se um mago branco.
Na realidade, cada ser humano
tem um Mestre, e se não for um Mestre visível, será um Mestre invisível. Os
criminosos têm, no mundo invisível, um mestre que não cessa de aconselhá-los
a prejudicar os outros. E mesmo que eles digam:
"Nós, um mestre?
Nunca!", devem ficar a saber, estes cegos, que têm um mestre cujos
conselhos perniciosos seguem dia e noite.
É evidente que, quando eu lhe
falo de Mestres, refiro-me sempre aos verdadeiros grandes Mestres
espirituais, aos magos brancos. Sei bem que se dá
este título de Mestre a muitos artesãos para se mostrar que são excelentes na
sua profissão e também aos notários, aos magistrados, aos artistas, etc... É
uma maneira de ver as coisas e eu não lhes recuso este título. Mas, você deve
saber que um verdadeiro Mestre, no sentido espiritual do termo, é um ser
que, em primeiro lugar, conhece as verdades essenciais; não aquilo que os
homens escreveram, criaram ou contaram, mas o essencial segundo a Ciência
Cósmica.
Em segundo lugar, um Mestre
deve ter tido a vontade de dominar, dirigir e controlar tudo em si, e
realizado essa vontade. Por último, esta ciência e este domínio que ele
adquiriu devem servir apenas para manifestar todas as qualidades e virtudes
do amor desinteressado.
É pelo seu desinteresse que
reconhecerá um verdadeiro Mestre. Cada Mestre vem à terra para nela
manifestar uma qualidade particular: há, portanto, Mestres da sabedoria,
Mestres do amor, ou da força, ou da pureza...
Mas todos os verdadeiros
grandes Mestres têm, obrigatoriamente, uma qualidade em comum:
o desinteresse.
Há tantos impostores e
charlatães dispostos a aproveitarem-se da ingenuidade dos humanos!
Limitaram-se a ler livrecos de
ciências ocultas, muitas vezes escritos por ignorantes, e pronto! Passam a
apresentar-se em todo o lado como grandes Mestres. Não trazem consigo
qualquer sinal de que o Céu os reconheceu como tal; foram eles próprios que
se declararam Mestres e acreditam que isso chega. E os outros, em vez de
estudarem um pouco um ser destes para ver como ele se comporta, seguem-no de
olhos fechados. Ele irá enganá-los, despojá-los, subjugá-los, mas eles não se
darão conta. Bom, é magnífico, eis pelo menos um ser inteligente! Os outros é
que são estúpidos.
Porque não procuraram saber de onde é que ele vem, como vive, quem foi seu Mestre, quem o enviou?... Ah, não, não, é inútil colocar essa questão; desde que ele lhes prometa iniciá-los em três dias - a troco de alguns milhares de dólares, é
claro - acreditam nele. Têm pressa, compreende? A iniciação não deve durar mais do que três dias. O mundo está cheio de gente desta, de burlões, de vigaristas, que se aproveitam da ingenuidade e da estupidez dos outros. Mas eles, pelo menos, são inteligentes!
Porque não procuraram saber de onde é que ele vem, como vive, quem foi seu Mestre, quem o enviou?... Ah, não, não, é inútil colocar essa questão; desde que ele lhes prometa iniciá-los em três dias - a troco de alguns milhares de dólares, é
claro - acreditam nele. Têm pressa, compreende? A iniciação não deve durar mais do que três dias. O mundo está cheio de gente desta, de burlões, de vigaristas, que se aproveitam da ingenuidade e da estupidez dos outros. Mas eles, pelo menos, são inteligentes!
Não nego que essas pessoas
possam ter alguns poderes - qualquer um, desde que se exercite, pode obter
certos poderes -, mas a questão está em saber como os empregam e em que
sentido. É a esse respeito que o Céu se pronuncia.
O Céu não se preocupa com os meios que possui, mas com o uso que deles faça. O que conta para o Céu não é sua ciência, nem sua clarividência, nem seus poderes, mas seu desinteresse. Você pode ter a ciência, a clarividência e os poderes, mas enquanto não for desinteressado, mesmo que os humanos o reconheçam como Mestre, o Céu não o reconhecerá.
O Céu não se preocupa com os meios que possui, mas com o uso que deles faça. O que conta para o Céu não é sua ciência, nem sua clarividência, nem seus poderes, mas seu desinteresse. Você pode ter a ciência, a clarividência e os poderes, mas enquanto não for desinteressado, mesmo que os humanos o reconheçam como Mestre, o Céu não o reconhecerá.
A desgraça dos humanos é a sua
falta de discernimento: ao encontrarem um
verdadeiro Mestre, desinteressado, desconfiarão, mas seguirão o primeiro
indivíduo que apareça e lhes lance poeira para os olhos, apresentando-se como
Mestre. Na realidade, um verdadeiro Mestre, nunca lhe dirá que é um Mestre, nunca; ele deixará senti-lo e compreendê-lo, não tem pressa de ser reconhecido.
Mestre. Na realidade, um verdadeiro Mestre, nunca lhe dirá que é um Mestre, nunca; ele deixará senti-lo e compreendê-lo, não tem pressa de ser reconhecido.
Um falso Mestre, pelo
contrário, a partir do momento em que decretou que é um Mestre, tem somente uma
idéia: impôr-se aos outros.
Acabei de receber uma carta de
um homem que acreditou ser capaz de tornar-se um guia espiritual: escreveu-me
para contar as suas dificuldades e as suas angústias. Evidentemente, era de
esperar. Por que motivo se pôs ele a enganar as pessoas com a pretensão de
guiá-las, enquanto ele próprio não estava em condições de fazê-lo?
Mas os humanos são assim,
julgam-se capazes de guiar os outros antes de terem adquirido as virtudes
necessárias: a sabedoria, o amor, a pureza, a força, o desinteresse.
Não! Enquanto não se tiver recebido ordem de um ser superior para assumir a
esmagadora tarefa de guiar os humanos,é muito perigoso, para quem quer que
seja, querer desempenhar este papel.
Eu gostaria muito de ajudar
este homem, porque vejo que ele é muito infeliz e nem sabe porquê. Imaginou
que bastava ler alguns livros de ciências ocultas e pôs-se a evocar as forças
poderosas do mundo invisível para as utilizar, sem ter aprendido previamente
a entrar em harmonia com elas. Pois bem, quando assim é, essas forças
vingam-se e dizem:
"Porque procura servir-se
de nós para satisfazer os seus caprichos? Nós não queremos submeter-nos a
você. É fraco e ignorante e merece uma boa lição."
Quantos pretensos ocultistas
não têm sequer um verdadeiro conhecimento das leis do mundo espiritual! Pode
crer: eles leram alguns livros e, sem se prepararem, querem fazer figuras aos
olhos de alguns discípulos, realizando prodígios perante eles. Pois bem, não
é assim que se deve fazer.
Para se assumir o papel de guia
espiritual, é necessário ter-se recebido um diploma, pois no mundo espiritual
também se recebem diplomas. Os diplomas que existem no plano físico têm a sua
correspondência no plano espiritual, à imagem
do qual o plano físico foi criado.
Os espíritos luminosos que nos
enviaram à terra observam-nos, medem-nos e, se vêem que fizemos esforços, que
conseguimos dominar-nos e corrigir alguns dos nossos defeitos, dão-nos o
diploma.
E onde está esse diploma? Não será um papel, que pode ser apagado ou destruído. É como um selo que se imprime no nosso rosto e em todo o nosso corpo, para mostrar que obtivemos vitórias sobre nós próprios. Talvez os humanos não vejam isso, mas todos os espíritos da natureza, todos os espíritos luminosos, o vêem, mesmo de longe, e então obedecem-nos e ajudam-nos.
Sim, para se ter o direito de
executar certas tarefas no plano espiritual, é necessário obter também a
aprovação de certos seres, e não pense que é fácil.
Muitas pessoas acham que os
estudos necessários para se obter o diploma de educador ou de professor são
muito demorados e difíceis. Mas isso não é nada, nada mesmo, comparado com as
condições que têm que ser preenchidas por aqueles que querem ensinar aos
discípulos as verdades da ciência iniciática.
Eu fico sempre espantado ao ver
a ignorância e a ingenuidade das pessoas perante esta questão: todas, ou
quase todas, crêem que estão à altura de poder usar o título de Mestre,
imaginam que ele caiu assim do céu, já perfeito, sem Ter realizado o mínimo
esforço. Pois bem, você não encontrará criatura alguma que tenha vindo
perfeita à terra. Quer a mostrem, quer a escondam, todos têm a fraqueza, ou
mesmo várias. Até os grandes Iniciados têm pelo menos uma fraqueza; por vezes
é o medo, outras vezes o orgulho, ou a avareza, ou até a sensualidade. Mas a
superioridade de um Iniciado advém-lhe, em primeiro lugar, de ele estar consciente
dessa fraqueza e, em segundo lugar, do fato de empregar todos os meios para
triunfar sobre ela.
Qualquer ser, independentemente
da elevação do seu espírito, ao encarnar na terra, recebe dos pais como
herança uma matéria mais ou menos defeituosa que deverá transformar, o que
conseguirá graças às suas qualidades e virtudes.
E, quando o consegue, alcança
uma elevação ainda maior, porque foi capaz de transformar uma matéria bruta
em uma matéria elaborada de que poderá servir-se para o seu trabalho. É, pois,
nos Iniciados que se descobre verdadeiramente a força do espírito, pois eles
conseguem dominar tudo, ao passo que a maioria dos humanos arrasta consigo,
durante toda a vida, defeitos que não consegue vencer.
No entanto, também é necessário
que se saiba que um Iniciado vem à terra trazendo com ele as qualidades sobre
as quais trabalhou nas encarnações precedentes. Graças a essas qualidades,
ele afasta-se instintivamente do mau caminho e direciona-se, pelo contrário,
para atividades construtivas, luminosas. Mesmo que não se lembre de nada, ele
é impelido, sem se aperceber, a caminhar na mesma direção que seguiu no
passado. Pela minha parte, durante muito tempo não tive qualquer lembrança
das minhas encarnações, mas nasci nesta vida com marcas, registros, que me
impeliram em uma determinada direção.
Extraído do livro "O que é
um Mestre Espiritual?" Edições Prosveta; Portugal
Demita seus gurusÉ hora de acabar com a dependência e nos tornarmos tão grandes quanto os mestres que seguimos – tão autênticos, peculiares e obstinados quanto eles - por Tijn Touber
"Todo homem deve chegar aos céus à sua própria maneira" |
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Frederico II (1712-1786), rei da Prússia
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Contudo, comecei a duvidar se a relação entre um guru e seus seguidores seria mesmo a melhor maneira de atingir a libertação. Afinal, pouquíssimas vezes encontrei um seguidor que houvesse alcançado a iluminação - alguém que parecesse tão sábio e radiante quanto seu mestre. A maioria dos seguidores era gente devota, mas que duvidava muito de si mesma. Percebi também, em mim mesmo, que algumas vezes eu parecia encolher na presença de um guru que inspirava admiração em todos. Seria um sentimento de honra e respeito ou seria medo de me erguer sobre meus próprios pés?
Há mais de mil anos, o mestre zen chinês Lin Chi chamava a atenção para o perigo dos gurus. Ele via como muitos de seus contemporâneos transferiam a responsabilidade por seu bem-estar espiritual para outros. Com isso, dizia ele, as pessoas abriam mão de seu poder e de sua autenticidade. Esta observação levou-o a fazer uma declaração que se tornaria célebre: "Se o Buda cruzar seu caminho, mate-o". Em outras palavras, se você acha que vai encontrar a iluminação fora de si mesmo, está no caminho errado. Afinal, a essência dos ensinamentos do Buda é que todos carregam um Buda dentro de si - ou, em outros termos, todos somos Buda.
Os ensinamentos de Lin Chi continuam atuais ainda hoje. Apesar da extrema individualização do mundo ocidental moderno, as pessoas continuam em busca de algo em que se apoiar. Hoje há mais gurus do que nunca, embora os títulos tenham mudado: conselheiro mental, terapeuta, assistente social.
O mestre Lin Chi tem uma declaração célebre: "Se o Buda cruzar o seu caminho, mate-o"
Gurus e conselheiros profissionais não são os únicos que tendem a tornar as pessoas dependentes e a mantê-las subjugadas. Pais e educadores muitas vezes fazem o mesmo. Quantos deles vêem o "Buda" nas crianças? Em vez de encorajá-las a confiar em sua sabedoria inata, eles as entopem de fatos e números. Quase nunca perguntamos às crianças quem elas são, e sim o que desejam ser. A mensagem subjacente é a seguinte: vocês não são coisa alguma, mas se fizerem o que recomendamos, poderão se tornar alguém no futuro. Conseqüentemente, instilam em nós desde cedo que temos de mergulhar fundo na sabedoria dos outros em vez de explorar a sabedoria existente dentro de nós.
A idéia de que temos de nos tornar alguma coisa para sermos bem-sucedidos, livres ou felizes é um enorme mal-entendido. A convicção de que um caminho externo pode nos guiar a algo melhor é a razão pela qual praticamente ninguém jamais chega a seu destino. Se estamos sempre a caminho, jamais chegaremos a parte alguma. No bar que costumo freqüentar há uma placa com os dizeres: "Cerveja grátis amanhã". É claro que o amanhã nunca chega.
Os gurus também prometem a iluminação para mais tarde, condenando seus seguidores à eterna dependência. É uma via de mão dupla. O que seria do guru se ele não tivesse seguidores?
Naturalmente, alguns personagens influentes não ficaram encurralados nessa mútua dependência. Estes são os mestres radicais, que não toleram seguidores nem tietes, porque sabem que a liberdade espiritual só pode ser alcançada por aqueles que ousam se apresentar nus perante a verdade, sem lealdade prévia a uma doutrina ou guru. Jesus jamais teria se tornado cristão, tampouco Buda seria budista. Esses mestres eram rebeldes que seguiam antes de tudo a si mesmos (ou a Deus?). O analista Carl Gustav Jung é mais um exemplo. Certa vez, ele disse: "Graças a Deus não sou junguiano".
Uma relação desigual implica a existência de uma muralha que o seguidor dificilmente terá condições de atravessar. Superar o mestre é difícil, sobretudo se aprendemos a não confiar em nossa própria sabedoria. Seria esta a razão pela qual a palavra tibetana para guru, ou lama, é traduzida como "insuperável"?
O seguidor não percorre uma trajetória própria, e sim a de um outro, porque se trata de um caminho já palmilhado. Portanto, não há necessidade de muito esforço para segui-lo. Tampouco o discípulo aprende as mesmas lições. A conclusão a que o mestre chega - o resultado do trabalho espiritual - não é a mesma a que chega seu seguidor. O mestre experimentou tanto a trajetória quanto o destino. O discípulo conhece apenas o destino, conforme descrito pelo mestre.
Esta é a razão pela qual os discípulos quase sempre são mais santos do que o papa e mais radicais em suas opiniões do que o mestre. Tais opiniões, não raro, podem ser reduzidas a cápsulas de fácil digestão. Afinal, quanto mais inseguras forem as pessoas, tanto mais se apegarão à "verdade". Além disso, a maior parte dos discípulos não entende totalmente os ensinamentos do mestre, por isso insights sutis e complexos são pasteurizados de forma a que se convertam em conceitos de fácil absorção e entendimento.
Os gurus prometem a iluminação para o futuro, e condenam seguidores à dependência
Talvez os gurus não sejam mestres a ser imitados. Talvez sejam muito mais exemplos que podem nos servir de inspiração. Eles nos mostram que é possível atingir um estado superior de consciência, mas cabe a nós chegar lá. Portanto, é hora de mandar embora os gurus (fatos, verdades, crenças, princípios, dogmas) para que o guru dentro de nós aflore. É hora de nos tornarmos tão grandes quanto os gurus que seguimos - tão autênticos, peculiares e obstinados quanto eles. Não se trata de um ato de transgressão ou de desrespeito. A maior homenagem que podemos prestar a nossos gurus é deixar claro que não precisamos mais deles. O tratamento deu certo: o guru morreu.
Este artigo foi publicado originalmente na edição de setembro de 2007 da revista Ode
Ilustrações_Meire de Oliveira
Você mesmo não é um guru?Publicado em 19 junho 2012 em Jiddu Krishnamurti
Pergunta: Apesar de sua enfática negação da necessidade de um guru, você mesmo não é um guru? Qual é a diferença?
Krishnamurti: Senhor, o que você quer dizer com guru? Por que você precisa de um guru? Se você me transforma em um ou não, eu não estou me fazendo de guru para você.
Por isso um seguidor é uma maldição. O seguidor é o destruidor, o seguidor é o explorador. (Riso) Não ria, pense nisso muito seriamente e veja a consequência disto. Vamos examinar esta questão.
O que você quer dizer com guru?
Geralmente você quer dizer – não é? – aquele que vai levá-lo à realidade. Seu guru não é o homem a quem você pode perguntar a direção da estação. Você não chamaria o professor de guru, o homem que lhe ensina piano. Obviamente, você quer dizer com guru aquele que vai levá-lo à verdade, lhe dar um modo de conduta, aquele que lhe dará a chave ou abrirá a porta, lhe dará nutrição, sustento e coragem – isto é, alguém que vai gratificá-lo profundamente.
Você já conhece as gratificações superficiais, e quer uma gratificação mais profunda, uma satisfação profunda, então se volta para alguém que irá ajudá-lo; você busca um guru porque você mesmo está confuso, e quer direção, quer que lhe digam como agir e o que fazer.
Então todas essas coisas estão envolvidas nisto; mas por guru queremos dizer, principalmente, aquele que vai nos ajudar a elucidar os problemas da vida – não os problemas técnicos, mas os problemas psicológicos mais sutis, ocultos.
Agora, tem a verdade um lugar permanente? Tem a verdade um ponto fixo? Tem a verdade domicílio fixo, ou a verdade é dinâmica, uma coisa viva, e, portanto sem lugar de repouso?
A verdade está em constante movimento; mas se você diz que ela é um ponto fixo, então terá que encontrar um guru que levará você até ela, e o guru se torna necessário como indicador. Significa que você e o guru devem saber que a verdade está lá, num lugar fixo, como a estação.
Então você pode perguntar o caminho, então pode chegar ao ponto fixo; e para conseguir isso, precisa de um guru que vai guiá-lo e levá-lo àquela coisa fixa. Mas a verdade é uma coisa fixa? E se é fixa, é verdadeira? Também, se você quer a verdade e vai a um guru, deve saber o que a verdade é, não deve?
Quando você vai até um guru, não diz “Eu quero descobrir a realidade”, ao contrário, você diz “Ajude-me a perceber a verdade”. Portanto, você já tem uma ideia do que ela é, já conhece seu conteúdo, sua beleza, seu encanto, sua fragrância. Você sabe o que ela é?
Como pode um homem confuso conhecer a clareza?
Ele só pode conhecer a confusão, ou pensa em clareza com o oposto do que é.
- Poona India 6th Public Talk 3rd October, 1948
Extraído de: http://www.jkrishnamurti.org/…/krishnamurti-te…/view-daily-q...
Krishnamurti: Poderíamos investigar e relacionar – não apenas do ponto de vista tradicional – o campo total da tradição com aquilo de que temos estado falando, e ver as divergências, as contradições, as semelhanças e ver também se há algo novo no que estamos dizendo? Discutamos isto. Questionemos isto do começo ao fim.
A: Poderíamos começar com os quatro Purusharthas – Dharma, Artha, Kama e Moksha. Se examinamos o modo tradicional de abordar a vida, vemos que a tradição começa com o fato de que a existência humana tem estes quatro aspectos, e que cada um é vital, essencial, para o desenvolvimento da compreensão.
Krishnamurti: Não deveríamos começar pelo sentido de tudo isso?
A: Os fundamentalistas começam com o sentido de tudo isso, com os quatro aspectos.
Krishnamurti: Não deveríamos averiguar o que tudo isso significa? – a existência humana, a dor humana, o conflito. O que significa tudo isso? Como os profissionais respondem a esta pergunta?
SW: Na tradição nos encontramos com duas direções definidas: a ortodoxa, que se rege pela interpretação verbal dos fatos, e a da libertação, tal como se vê em Dattatreya e no Yoga Vasishta. Aqueles que vieram e se libertaram, diziam: “Nada de Guru”. “Nós descobrimos por nós mesmos”. “Eu não jurarei pelos Vedas”. “Toda a Natureza, todo o mundo é meu Guru”. “Observa e compreende ao mundo”. No Buda também houve uma libertação. Seu ensinamento representa a essência da pauta libertadora. Aqueles que se libertam, estão estreitamente ligados a vida.
No Yoga Vasishta se diz que a mente está cheia de pensamentos, de conflitos, e estes conflitos surgem devido ao desejo e ao temor: a menos que se possa resolve-los, é incapaz de compreender. Se fala ali do pensar negativo. Max Mueller e alguns outros interpretaram mal a palavra Nirodha; essa palavra não significa repressão, significa negação.
Muito foi dito dos Gurus. O Yoga Vasishta diz que a iniciação e outras ações semelhantes carecem de significado. O despertar do discípulo está na correta compreensão e na tomada de consciência. Apenas esse fato é de primeiríssima responsabilidade. Estas realidades essenciais são o coração da tradição libertadora.
R: E no entanto, há muitas partes no Yoga Vasishta onde se diz que sem um Guru não se pode descobrir nada.
A: A libertação com respeito a que? Se é um libertar-se do sistema social, a tradição libertadora também continua com o sistema social.
SW: O problema da compreensão é abordado pela tradição de um modo puramente verbal. Na tradição libertadora, isto não é assim. O libertar-se não é com respeito à sociedade. Existem as duas tradições. Nos Mathas ou monastérios se fala dos Vedas, mas o que se diz ali não tem nada com a vida; foram outros os que relacionaram com a vida tudo o que compreenderam. Mas tudo quanto foi dito nada tinha que ver com a sociedade.
R: Como é que a tradição do Guru se tornou tão importante?
Krishnamurti: Discutiremos esta questão do Guru? Começaremos com isso? O que significa a palavra ‘Guru’?
SW: ‘Desika’ é a palavra correta, e não Guru. Desika quer dizer: alguém que ajuda a despertar ao discípulo, alguém que ajuda ao que busca, a fim de que possa compreender. A palavra significa: alguém que aprende.
R: O discípulo se chama Shishya. Shishya é alguém que está capacitado para aprender.
SW: Guru significa vasto, superior, grande.
Krishnamurti: Se o Guru é alguém grande, superior, profundo, então que relação tem com um discípulo?
SW: Nos Upanishads é um ser todo amor e compaixão. Então se sustem que a compaixão é o contato entre o Guru e o discípulo.
Krishnamurti: Como é então que a tradição se tornou autoritária? Como é que nela há um sentido de disciplina, de seguir, de aceitação com respeito a qualquer coisa que disse o Guru? Como se introduziu isso na relação? A relação autoritária, compulsiva, se interpõe no caminho da verdadeira compreensão, destrói a iniciativa. Como surge uma relação assim?
SW: É difícil dize-lo. Os dois modos de abordar o problema devem haver existido durante muito tempo. Em uma das tradições, o Guru é considerado um amigo, uma pessoa a que o discípulo ama; aí o Guru não é de nenhuma forma autoritário. A outra tradição explora, necessita da autoridade, de seguidores.
A: O ponto principal que está sendo colocado pelo Swami é que não houve uma corrente homogênea. Existem o estranho e o conformista. O não-conformista é alguém que rechaça a sociedade; é um estranho, está fora da sociedade.
R: Voltamos outra vez para a primeira pergunta: que sentido tem tudo isso? A parte da questão dos Gurus, qual é a resposta fundamental à vida?
Krishnamurti: Me pergunto se poderíamos descobri-la.
Você poderia aprofundar isso? Poderia extrair tudo de mim? Compreende o que quero dizer?
Você chega a um poço e extrai água de acordo com o tamanho do balde; conforme a vasilha que você traz, assim será a quantidade de água que obterá.
Você leu muito da antiga literatura, praticou, leu o que eles disseram a respeito. Está muito bem provido com o ponto de vista tradicional, e sabe o que é o que está acontecendo no mundo. Agora nos encontramos você e eu.
Extraia de mim tanto quanto possa. Perguntem-me acerca de tudo, desde o princípio até o fim. Inquira profundamente como conformista e como não-conformista, como Guru e como não-Guru, como discípulo e não-discípulo.
Isso é como chegar a um poço tendo uma sede tremenda. Querendo investigar tudo.
Faça assim, senhor. Penso que então isso será de utilidade.
SW: Então poderei ser absolutamente livre?
Krishnamurti: Abra todas as janelas, porque eu sinto que a sabedoria é infinita. Não tem limites, e ao carecer de fronteiras, é totalmente impessoal.
Assim é que com toda a sua experiência, seu conhecimento, com tudo quanto tenha compreendido da tradição, com seu esquema libertador que também se converte em tradição, com o que você sabe e compreendeu, desde suas próprias meditações, desde sua própria vida, você vem a mim.
Não se satisfaça com apenas umas poucas palavras. Sonde profundamente.
SW: Eu gostaria de saber como você chegou a isso por si mesmo.
Krishnamurti: Você quer saber como esta pessoa deu com isso? Eu não poderia explicá-lo.
Veja senhor, ele nunca passou por nenhuma prática, disciplina, ciúmes, inveja, ambição, competência, nunca desejou poder, posição, prestígio, fama. Não desejou nada disso. Portanto, nunca se apresentou o problema de renunciar. Assim, quando digo que realmente não sei, penso que essa é a verdade.
A maioria dos instrutores tradicionais sofrem, renunciam, praticam, sacrificam, controlam; se sentam sob uma árvore e encontram com a luz.
SW: Então, quero perguntar outra coisa. Em seus ensinamentos, a sensibilidade, a compreensão, a percepção passiva, são fatores que devem saturar nosso viver. Como você deu com Isto?
A: Você pode não ter tido nada a que renunciar, e portanto não necessitou de disciplina, de Sadhana, mas o que acontece com as pessoas que têm algo a renunciar?
Krishnamurti: Você pergunta como dei com isto? Realmente, não poderia dize-lo. Por que se preocupa a respeito? Que importância tem isso?
SW: Quando você fala de percepção alerta, de sensibilidade, nos enchemos de admiração e reconhecimento. Como você chegou a isto? Nos perguntamos: como é que esse homem pode falar de tal maneira? E quando analisamos o que você diz, isso é tão científico, tão racional e pleno de significação!
Krishnamurti: Você conhece a estória de como recolheram o menino. Ele havia nascido na mais ortodoxa família brahmânica; não foi condicionado pela tradição, nem por nenhum dos outros fatores ao longo de sua vida – como hindu, como teósofo. Nada disso influiu nele.
Primeiramente, não sei por que isso não influiu nele.
A: Como aconteceu que uma pessoa que está em meio a um ambiente que colocava a máxima ênfase sobre a vida fenomenal, não ficava emaranhada nessa vida?
SW: Krishnamurti conseguiu. Ele não pode explicá-lo, mas quando fala emprega certos termos e toda a lógica dele está aí. E para o que escuta, é assombroso ver como sem nada, ele chegou a isso; e não obstante, há uma lógica.
Krishnamurti: Como é que um homem como ‘K’, que não leu os livros sagrados, as escrituras do oriente ou do ocidente, que não experimentou, renunciou, sacrificou, que não passou por toda esta escala, como é que ele diz estas coisas? Realmente não poderia dizer-lhe, senhor.
A: Você deu a resposta faz um minuto; disse que a sabedoria não é pessoal.
Krishnamurti: Mas ele pergunta como alguém deu com a sabedoria sem tudo isto.
SW: Eu não pergunto como ele deu com ela, mas em suas palavras há tal força moral, tal racionalidade, uma seqüência lógica tão perfeita, que quando isso advém, quem lhe escuta descobre nisso beleza, júbilo... Isso está em seu coração.
Krishnamurti: Quando você diz que isto advém porque está no coração, eu não sei como expressá-lo. Advém. Não sei de que maneira; não do coração ou da mente, mas sim que advém. Ou diria você, que isso chegaria a qualquer pessoa que fosse realmente não-egocênctrica...?
SW: Perfeitamente, sim.
Krishnamurti: Penso que essa seria a resposta mais lógica.
SW: Você viu a infelicidade da humanidade e então adveio isso?
Krishnamurti: Não.
Para responder a esta pergunta de maneira realmente correta, completa, deve ser investigada a questão em sua totalidade. Havia esta criança que foi recolhida. Passou por toda classe de coisas; foi proclamado o Messias, foi adorado, lhe deram grande quantidade de bens, teve um grande séquito... Nada disso influiu sobre ele. Assim como aceitou terras, as devolveu. Havia pois esse menino, e ele nunca havia lido filosofia, psicologia, os livros sagrados, e jamais havia praticado nada. E existia essa qualidade de falar a partir do vazio.
SW: Sim.
Krishnamurti: Compreende, senhor?
Jamais há acumulação alguma, a partir da qual ele fale.
Assim, quando você formula a pergunta, “como é que ele diz estas coisas?”, isso envolve uma interrogação muito mais ampla, que é: pode a sabedoria ou como queira chamá-la, ser contida dentro de alguma consciência particular, ou ela está mais além de toda consciência particular?
Senhor, olhe este vale, os montes, as árvores, as pedras; o vale é tudo isso. Sem o conteúdo do vale, não haveria vale. Assim, se não há conteúdo na consciência, não há consciência – no sentido do limitado.
Quando você formula a pergunta, “como é que ele diz estas coisas?”, eu realmente não o sei. Mas pode responder a isso dizendo que quando isso ocorre, a mente está completamente vazia. Isto não significa que alguém se converta num médium.
SW: Deduzo disto que o infinito é beleza, lógica, racionalidade. Sua expressão está cheia de simetria.
Krishnamurti: Senhor, havendo-se dito tudo isto, o que é que você deseja averiguar? Você tem capacidade, leu muitíssimo, tem conhecimentos, experiência, fez práticas e meditação; pergunte a partir daí.
SW: A consciência é escravidão. Apenas a partir do vazio pode alguém entrar nisso...
Krishnamurti: Você pergunta então como um ser humano pode esvaziar a mente, não é assim?
SW: Existe uma idéia tradicional do Adhikari, a pessoa que é capaz de aprender. E a idéia tradicional é que há níveis ou diferenças nas pessoas que podem receber ou aprender. O que o Adhikari pode aprender depende dessa diferença. Há três níveis; nos textos ortodoxos são mencionados como Sattva, Rajas e Tamas.
Krishnamurti: Você diz que assim como estão constituídos os seres humanos, há níveis, gradações de receptividade. Eles estão ainda dentro do processo do devir, e é possível para tais pessoas dar com isto?
SW: Essa é uma parte. A outra é que para a maioria das pessoas existem os momentos de compreensão. Mas estes se escorrem.
É uma luta constante. O que há de fazer uma pessoa assim?
Krishnamurti: Sabendo que há níveis, é possível cortar através destes níveis?
A: Essa é uma questão de tempo?
SW: Podemos cortar através destes níveis? Ou melhor, há processos mediante os quais podemos transcender os níveis?
R: A tradição diz que é necessário um longo processo de tempo.
SW: Não estou de acordo com isso.
R: É necessário a capacidade de compreender.
A: Eu digo que minha vida é uma vida de devir. Quando venho aqui e me sento junto de você, você me diz que o tempo é irrelevante. Eu digo ‘sim’ porque isso é claro, mas estou de volta no campo do tempo, do esforço, etc., e esta coisa que eu sinto que compreendi, me escapa.
Krishnamurti: A questão é bastante clara. O problema consiste em que quando escuto, parece que compreendo, e quando me vou, isso se desvanece.
E o outro ponto é: como há de fazer alguém que não é brilhante, que não é analítico, para romper com seu condicionamento e dar com isso?
Qual é sua resposta a isto?
SW: Minha resposta, que provêm da experiência, a resposta tradicional, é: que o homem pratique algum tipo de meditação através da qual a mente se torne muito mais alerta.
Krishnamurti: Ou seja, realizar certas práticas, certos exercícios, respiração, etc., até que a mente seja capaz de compreender.
E há o outro que diz: quando eu lhe escuto, compreendo, mas isso me escapa... Estes são dois problemas.
Em primeiro lugar, tome uma mente que carece de capacidade. Como uma mente assim será capaz de ver, compreender sem a prática, sem o processo do tempo? O tempo implica um processo, certo? Sem tempo, como uma mente assim irá dar com isto?
Minha mente é lerda. Minha mente não tem a claridade necessária para compreender isto de imediato. Assim, você me diz que devo praticar, respirar, comer menos, me pede que pratique todos os métodos e sistemas que ajudarão a minha mente se tornar clara, aguda, sensível.
Tudo isso implica tempo e quando admito o tempo, há outros fatores que intervêm na mente. Se eu tenho de ir daqui até lá, o cobrir essa distância leva tempo. Ao percorrer essa distância, há outros fatores intervindo durante a viagem, de modo tal que nunca chego lá; antes de chegar vejo algo formoso que me entusiasma.
O caminho não é uma senda reta e estreita pala qual avanço; sucedem inumeráveis coisas. Estes acontecimentos, incidentes, impressões, vão mudar a direção do movimento.
E essa coisa que estou tratando de compreender, também não é um ponto fixo.
A: O ponto que não é uma coisa fixa deve ser explorado.
Krishnamurti: Eu digo que minha mente está confusa, perturbada, não compreendo. Você me diz que compreenda fazendo estas coisas. Portanto você estabeleceu a compreensão como um ponto fixo. E ela não é um ponto fixo.
SW: Não é um ponto fixo.
Krishnamurti: Obviamente. Se é um ponto fixo e eu vou até ele, existem outros fatores que intervêm em minha viagem até este ponto, e estes fatores vão influenciar em mim muito mais que o fim para o qual me dirijo.
A: Esse fim é uma projeção da mente que supõe conhecê-lo.
Krishnamurti: Esse caminho não é o caminho em absoluto; primeiro veja, não é um ponto fixo e nunca poderá ser. Portanto, digo que isso é algo totalmente falso.
Então, como esse não é o caminho, e posto que nego toda a coisa, varri um campo tremendo: todas as práticas, meditações, todo o conhecimento. Com que fiquei então? Fiquei com o fato de que estou confuso, de que sou lerdo.
Agora, como é que sei que sou lerdo e que estou confuso? Apenas por meio da comparação, porque sei que você é muito receptivo, e comparando, medindo, digo que sou lerdo. Não comparo, e então vejo o que fiz mediante a comparação.
Comparando, reduzi a mim mesmo a um estado que eu chamo ‘lerdo’, e vejo que tão pouco é o caminho. De modo que descarto a comparação. Sou lerdo então, se não comparo?
Assim é que descarto o sistema, um processo, um fim fixo que você desenvolveu como um meio de esclarecimento através do tempo. Digo que a comparação não é o caminho. Medida significa distância.
SW: Isso quer dizer que esta compreensão não é absolutamente um assunto vitalmente relacionado com a capacidade? Nós começamos pela capacidade...
Krishnamurti: Eu digo que escuto a você, Swamiji, mas que não o compreendo. Não sei o que é que não compreendo, mas você me mostra – o tempo, o processo, o ponto fixo, etc..
Você me mostra tudo isso, e eu o descarto.
O que ocorreu a minha mente então? No próprio descartar, no negar, a mente se tornou menos lerda. A negação do falso clarifica a mente; e o negar a comparação, que também é falsa, aguça a mente.
Em conseqüência, o que me restou agora? Apenas ao comparar-me com você eu sei que sou lerdo. O embotamento existe ao medir a mim mesmo com o que se chama aguçamento, e então digo que não medirei. Portanto, sou lerdo? Abandonei completamente a comparação, e a comparação significa conformidade.
O que restou então? A coisa que eu chamo ‘lerda’ não é lerda, é ‘o que é’. O que me restou ao final de tudo isto? Tudo que me restou é que não compararei jamais. Não me medirei com alguma pessoa que é superior a mim, e não pisarei esta senda belamente projetada para mim. Deste modo descarto todas as estruturas que o homem impôs sobre mim, destinadas a alcançar a iluminação.
Aonde me encontro, então? Começo pelo princípio. Não sei nada sobre a iluminação, a compreensão, o processo, a comparação, o devir. Descartei tudo isso. Não sei. O conhecimento é o meio de ferir-me, e a tradição é o instrumento pelo qual eu fico ferido. Começo com total inocência. A inocência implica uma mente incapaz de ser ferida.
Agora digo a mim mesmo: por que eles não vêm este fato simples de que não há um ponto fixo? Por que amontoam tudo isto na mente humana, de maneira que eu tenha de atravessar por tudo isso, e descartar tudo?
Isto é muito interessante, senhor. Por que passar por todo este processo, se tenho que descartá-lo? Por que você não me disse: não compare, a verdade não é um ponto fixo? Florescerá em bondade por meio da comparação?
Pode-se conquistar a humildade através do tempo, da prática? Obviamente, não. E no entanto, você tem insistido sobre a prática, por que? Quando você insiste na prática, pensa que está se dirigindo para um ponto fixo. Portanto, enganou a si mesmo e está enganando a mim. Não me diz: você não sabe nada e eu não sei nada, averiguemos se todas as coisas que os seres humanos impuseram sobre outros seres humanos, são verdadeiras ou falsas. Eles disseram que a iluminação é algo que deve ser alcançada através do tempo e da disciplina, por meio de um Guru. Investiguemos, descubramos se isto é ou não é verdade.
Por que os seres humanos impuseram sobre outros seres humanos algo que não é verdadeiro? Torturaram a si mesmos, castigaram-se com o fim de atingir a iluminação, como se a iluminação fosse um ponto fixo. E terminaram cegos. Penso senhor, que isso é porque aquele que chamam de ‘o homem errado’ está muito mais próximo da verdade que o homem que pratica para alcançar a verdade.
Um homem que pratica a verdade se torna impuro, um homem assim não conhece a castidade.
Vale do Rishi
23 de janeiro de 1971
do livro: Tradicion y Revolucion
Editora Edhasa
tradução: MST-Jina
Extraído de: http://www.lojajinarajadasa.com/4.h.6.html
Krishnamurti: Senhor, o que você quer dizer com guru? Por que você precisa de um guru? Se você me transforma em um ou não, eu não estou me fazendo de guru para você.
Por isso um seguidor é uma maldição. O seguidor é o destruidor, o seguidor é o explorador. (Riso) Não ria, pense nisso muito seriamente e veja a consequência disto. Vamos examinar esta questão.
O que você quer dizer com guru?
Geralmente você quer dizer – não é? – aquele que vai levá-lo à realidade. Seu guru não é o homem a quem você pode perguntar a direção da estação. Você não chamaria o professor de guru, o homem que lhe ensina piano. Obviamente, você quer dizer com guru aquele que vai levá-lo à verdade, lhe dar um modo de conduta, aquele que lhe dará a chave ou abrirá a porta, lhe dará nutrição, sustento e coragem – isto é, alguém que vai gratificá-lo profundamente.
Você já conhece as gratificações superficiais, e quer uma gratificação mais profunda, uma satisfação profunda, então se volta para alguém que irá ajudá-lo; você busca um guru porque você mesmo está confuso, e quer direção, quer que lhe digam como agir e o que fazer.
Então todas essas coisas estão envolvidas nisto; mas por guru queremos dizer, principalmente, aquele que vai nos ajudar a elucidar os problemas da vida – não os problemas técnicos, mas os problemas psicológicos mais sutis, ocultos.
Agora, tem a verdade um lugar permanente? Tem a verdade um ponto fixo? Tem a verdade domicílio fixo, ou a verdade é dinâmica, uma coisa viva, e, portanto sem lugar de repouso?
A verdade está em constante movimento; mas se você diz que ela é um ponto fixo, então terá que encontrar um guru que levará você até ela, e o guru se torna necessário como indicador. Significa que você e o guru devem saber que a verdade está lá, num lugar fixo, como a estação.
Então você pode perguntar o caminho, então pode chegar ao ponto fixo; e para conseguir isso, precisa de um guru que vai guiá-lo e levá-lo àquela coisa fixa. Mas a verdade é uma coisa fixa? E se é fixa, é verdadeira? Também, se você quer a verdade e vai a um guru, deve saber o que a verdade é, não deve?
Quando você vai até um guru, não diz “Eu quero descobrir a realidade”, ao contrário, você diz “Ajude-me a perceber a verdade”. Portanto, você já tem uma ideia do que ela é, já conhece seu conteúdo, sua beleza, seu encanto, sua fragrância. Você sabe o que ela é?
Como pode um homem confuso conhecer a clareza?
Ele só pode conhecer a confusão, ou pensa em clareza com o oposto do que é.
- Poona India 6th Public Talk 3rd October, 1948
Extraído de: http://www.jkrishnamurti.org/…/krishnamurti-te…/view-daily-q...
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O GURU, A TRADIÇÃO E A LIBERDADE
Krishnamurti: Poderíamos investigar e relacionar – não apenas do ponto de vista tradicional – o campo total da tradição com aquilo de que temos estado falando, e ver as divergências, as contradições, as semelhanças e ver também se há algo novo no que estamos dizendo? Discutamos isto. Questionemos isto do começo ao fim.
A: Poderíamos começar com os quatro Purusharthas – Dharma, Artha, Kama e Moksha. Se examinamos o modo tradicional de abordar a vida, vemos que a tradição começa com o fato de que a existência humana tem estes quatro aspectos, e que cada um é vital, essencial, para o desenvolvimento da compreensão.
Krishnamurti: Não deveríamos começar pelo sentido de tudo isso?
A: Os fundamentalistas começam com o sentido de tudo isso, com os quatro aspectos.
Krishnamurti: Não deveríamos averiguar o que tudo isso significa? – a existência humana, a dor humana, o conflito. O que significa tudo isso? Como os profissionais respondem a esta pergunta?
SW: Na tradição nos encontramos com duas direções definidas: a ortodoxa, que se rege pela interpretação verbal dos fatos, e a da libertação, tal como se vê em Dattatreya e no Yoga Vasishta. Aqueles que vieram e se libertaram, diziam: “Nada de Guru”. “Nós descobrimos por nós mesmos”. “Eu não jurarei pelos Vedas”. “Toda a Natureza, todo o mundo é meu Guru”. “Observa e compreende ao mundo”. No Buda também houve uma libertação. Seu ensinamento representa a essência da pauta libertadora. Aqueles que se libertam, estão estreitamente ligados a vida.
No Yoga Vasishta se diz que a mente está cheia de pensamentos, de conflitos, e estes conflitos surgem devido ao desejo e ao temor: a menos que se possa resolve-los, é incapaz de compreender. Se fala ali do pensar negativo. Max Mueller e alguns outros interpretaram mal a palavra Nirodha; essa palavra não significa repressão, significa negação.
Muito foi dito dos Gurus. O Yoga Vasishta diz que a iniciação e outras ações semelhantes carecem de significado. O despertar do discípulo está na correta compreensão e na tomada de consciência. Apenas esse fato é de primeiríssima responsabilidade. Estas realidades essenciais são o coração da tradição libertadora.
R: E no entanto, há muitas partes no Yoga Vasishta onde se diz que sem um Guru não se pode descobrir nada.
A: A libertação com respeito a que? Se é um libertar-se do sistema social, a tradição libertadora também continua com o sistema social.
SW: O problema da compreensão é abordado pela tradição de um modo puramente verbal. Na tradição libertadora, isto não é assim. O libertar-se não é com respeito à sociedade. Existem as duas tradições. Nos Mathas ou monastérios se fala dos Vedas, mas o que se diz ali não tem nada com a vida; foram outros os que relacionaram com a vida tudo o que compreenderam. Mas tudo quanto foi dito nada tinha que ver com a sociedade.
R: Como é que a tradição do Guru se tornou tão importante?
Krishnamurti: Discutiremos esta questão do Guru? Começaremos com isso? O que significa a palavra ‘Guru’?
SW: ‘Desika’ é a palavra correta, e não Guru. Desika quer dizer: alguém que ajuda a despertar ao discípulo, alguém que ajuda ao que busca, a fim de que possa compreender. A palavra significa: alguém que aprende.
R: O discípulo se chama Shishya. Shishya é alguém que está capacitado para aprender.
SW: Guru significa vasto, superior, grande.
Krishnamurti: Se o Guru é alguém grande, superior, profundo, então que relação tem com um discípulo?
SW: Nos Upanishads é um ser todo amor e compaixão. Então se sustem que a compaixão é o contato entre o Guru e o discípulo.
Krishnamurti: Como é então que a tradição se tornou autoritária? Como é que nela há um sentido de disciplina, de seguir, de aceitação com respeito a qualquer coisa que disse o Guru? Como se introduziu isso na relação? A relação autoritária, compulsiva, se interpõe no caminho da verdadeira compreensão, destrói a iniciativa. Como surge uma relação assim?
SW: É difícil dize-lo. Os dois modos de abordar o problema devem haver existido durante muito tempo. Em uma das tradições, o Guru é considerado um amigo, uma pessoa a que o discípulo ama; aí o Guru não é de nenhuma forma autoritário. A outra tradição explora, necessita da autoridade, de seguidores.
A: O ponto principal que está sendo colocado pelo Swami é que não houve uma corrente homogênea. Existem o estranho e o conformista. O não-conformista é alguém que rechaça a sociedade; é um estranho, está fora da sociedade.
R: Voltamos outra vez para a primeira pergunta: que sentido tem tudo isso? A parte da questão dos Gurus, qual é a resposta fundamental à vida?
Krishnamurti: Me pergunto se poderíamos descobri-la.
Você poderia aprofundar isso? Poderia extrair tudo de mim? Compreende o que quero dizer?
Você chega a um poço e extrai água de acordo com o tamanho do balde; conforme a vasilha que você traz, assim será a quantidade de água que obterá.
Você leu muito da antiga literatura, praticou, leu o que eles disseram a respeito. Está muito bem provido com o ponto de vista tradicional, e sabe o que é o que está acontecendo no mundo. Agora nos encontramos você e eu.
Extraia de mim tanto quanto possa. Perguntem-me acerca de tudo, desde o princípio até o fim. Inquira profundamente como conformista e como não-conformista, como Guru e como não-Guru, como discípulo e não-discípulo.
Isso é como chegar a um poço tendo uma sede tremenda. Querendo investigar tudo.
Faça assim, senhor. Penso que então isso será de utilidade.
SW: Então poderei ser absolutamente livre?
Krishnamurti: Abra todas as janelas, porque eu sinto que a sabedoria é infinita. Não tem limites, e ao carecer de fronteiras, é totalmente impessoal.
Assim é que com toda a sua experiência, seu conhecimento, com tudo quanto tenha compreendido da tradição, com seu esquema libertador que também se converte em tradição, com o que você sabe e compreendeu, desde suas próprias meditações, desde sua própria vida, você vem a mim.
Não se satisfaça com apenas umas poucas palavras. Sonde profundamente.
SW: Eu gostaria de saber como você chegou a isso por si mesmo.
Krishnamurti: Você quer saber como esta pessoa deu com isso? Eu não poderia explicá-lo.
Veja senhor, ele nunca passou por nenhuma prática, disciplina, ciúmes, inveja, ambição, competência, nunca desejou poder, posição, prestígio, fama. Não desejou nada disso. Portanto, nunca se apresentou o problema de renunciar. Assim, quando digo que realmente não sei, penso que essa é a verdade.
A maioria dos instrutores tradicionais sofrem, renunciam, praticam, sacrificam, controlam; se sentam sob uma árvore e encontram com a luz.
SW: Então, quero perguntar outra coisa. Em seus ensinamentos, a sensibilidade, a compreensão, a percepção passiva, são fatores que devem saturar nosso viver. Como você deu com Isto?
A: Você pode não ter tido nada a que renunciar, e portanto não necessitou de disciplina, de Sadhana, mas o que acontece com as pessoas que têm algo a renunciar?
Krishnamurti: Você pergunta como dei com isto? Realmente, não poderia dize-lo. Por que se preocupa a respeito? Que importância tem isso?
SW: Quando você fala de percepção alerta, de sensibilidade, nos enchemos de admiração e reconhecimento. Como você chegou a isto? Nos perguntamos: como é que esse homem pode falar de tal maneira? E quando analisamos o que você diz, isso é tão científico, tão racional e pleno de significação!
Krishnamurti: Você conhece a estória de como recolheram o menino. Ele havia nascido na mais ortodoxa família brahmânica; não foi condicionado pela tradição, nem por nenhum dos outros fatores ao longo de sua vida – como hindu, como teósofo. Nada disso influiu nele.
Primeiramente, não sei por que isso não influiu nele.
A: Como aconteceu que uma pessoa que está em meio a um ambiente que colocava a máxima ênfase sobre a vida fenomenal, não ficava emaranhada nessa vida?
SW: Krishnamurti conseguiu. Ele não pode explicá-lo, mas quando fala emprega certos termos e toda a lógica dele está aí. E para o que escuta, é assombroso ver como sem nada, ele chegou a isso; e não obstante, há uma lógica.
Krishnamurti: Como é que um homem como ‘K’, que não leu os livros sagrados, as escrituras do oriente ou do ocidente, que não experimentou, renunciou, sacrificou, que não passou por toda esta escala, como é que ele diz estas coisas? Realmente não poderia dizer-lhe, senhor.
A: Você deu a resposta faz um minuto; disse que a sabedoria não é pessoal.
Krishnamurti: Mas ele pergunta como alguém deu com a sabedoria sem tudo isto.
SW: Eu não pergunto como ele deu com ela, mas em suas palavras há tal força moral, tal racionalidade, uma seqüência lógica tão perfeita, que quando isso advém, quem lhe escuta descobre nisso beleza, júbilo... Isso está em seu coração.
Krishnamurti: Quando você diz que isto advém porque está no coração, eu não sei como expressá-lo. Advém. Não sei de que maneira; não do coração ou da mente, mas sim que advém. Ou diria você, que isso chegaria a qualquer pessoa que fosse realmente não-egocênctrica...?
SW: Perfeitamente, sim.
Krishnamurti: Penso que essa seria a resposta mais lógica.
SW: Você viu a infelicidade da humanidade e então adveio isso?
Krishnamurti: Não.
Para responder a esta pergunta de maneira realmente correta, completa, deve ser investigada a questão em sua totalidade. Havia esta criança que foi recolhida. Passou por toda classe de coisas; foi proclamado o Messias, foi adorado, lhe deram grande quantidade de bens, teve um grande séquito... Nada disso influiu sobre ele. Assim como aceitou terras, as devolveu. Havia pois esse menino, e ele nunca havia lido filosofia, psicologia, os livros sagrados, e jamais havia praticado nada. E existia essa qualidade de falar a partir do vazio.
SW: Sim.
Krishnamurti: Compreende, senhor?
Jamais há acumulação alguma, a partir da qual ele fale.
Assim, quando você formula a pergunta, “como é que ele diz estas coisas?”, isso envolve uma interrogação muito mais ampla, que é: pode a sabedoria ou como queira chamá-la, ser contida dentro de alguma consciência particular, ou ela está mais além de toda consciência particular?
Senhor, olhe este vale, os montes, as árvores, as pedras; o vale é tudo isso. Sem o conteúdo do vale, não haveria vale. Assim, se não há conteúdo na consciência, não há consciência – no sentido do limitado.
Quando você formula a pergunta, “como é que ele diz estas coisas?”, eu realmente não o sei. Mas pode responder a isso dizendo que quando isso ocorre, a mente está completamente vazia. Isto não significa que alguém se converta num médium.
SW: Deduzo disto que o infinito é beleza, lógica, racionalidade. Sua expressão está cheia de simetria.
Krishnamurti: Senhor, havendo-se dito tudo isto, o que é que você deseja averiguar? Você tem capacidade, leu muitíssimo, tem conhecimentos, experiência, fez práticas e meditação; pergunte a partir daí.
SW: A consciência é escravidão. Apenas a partir do vazio pode alguém entrar nisso...
Krishnamurti: Você pergunta então como um ser humano pode esvaziar a mente, não é assim?
SW: Existe uma idéia tradicional do Adhikari, a pessoa que é capaz de aprender. E a idéia tradicional é que há níveis ou diferenças nas pessoas que podem receber ou aprender. O que o Adhikari pode aprender depende dessa diferença. Há três níveis; nos textos ortodoxos são mencionados como Sattva, Rajas e Tamas.
- Aqueles que pertencem a primeira categoria – Sattva – podem compreender escutando a um mestre.
- Os da categoria Rajas têm que escutar e recordar o escutado quando enfrentam algum problema da vida.
- Os Tamásicos não podem aprender porque suas mentes são demasiado lerdas. Para tornar sutil a mente existem muitos métodos, Upasanas.
Krishnamurti: Você diz que assim como estão constituídos os seres humanos, há níveis, gradações de receptividade. Eles estão ainda dentro do processo do devir, e é possível para tais pessoas dar com isto?
SW: Essa é uma parte. A outra é que para a maioria das pessoas existem os momentos de compreensão. Mas estes se escorrem.
É uma luta constante. O que há de fazer uma pessoa assim?
Krishnamurti: Sabendo que há níveis, é possível cortar através destes níveis?
A: Essa é uma questão de tempo?
SW: Podemos cortar através destes níveis? Ou melhor, há processos mediante os quais podemos transcender os níveis?
R: A tradição diz que é necessário um longo processo de tempo.
SW: Não estou de acordo com isso.
R: É necessário a capacidade de compreender.
A: Eu digo que minha vida é uma vida de devir. Quando venho aqui e me sento junto de você, você me diz que o tempo é irrelevante. Eu digo ‘sim’ porque isso é claro, mas estou de volta no campo do tempo, do esforço, etc., e esta coisa que eu sinto que compreendi, me escapa.
Krishnamurti: A questão é bastante clara. O problema consiste em que quando escuto, parece que compreendo, e quando me vou, isso se desvanece.
E o outro ponto é: como há de fazer alguém que não é brilhante, que não é analítico, para romper com seu condicionamento e dar com isso?
Qual é sua resposta a isto?
SW: Minha resposta, que provêm da experiência, a resposta tradicional, é: que o homem pratique algum tipo de meditação através da qual a mente se torne muito mais alerta.
Krishnamurti: Ou seja, realizar certas práticas, certos exercícios, respiração, etc., até que a mente seja capaz de compreender.
E há o outro que diz: quando eu lhe escuto, compreendo, mas isso me escapa... Estes são dois problemas.
Em primeiro lugar, tome uma mente que carece de capacidade. Como uma mente assim será capaz de ver, compreender sem a prática, sem o processo do tempo? O tempo implica um processo, certo? Sem tempo, como uma mente assim irá dar com isto?
Minha mente é lerda. Minha mente não tem a claridade necessária para compreender isto de imediato. Assim, você me diz que devo praticar, respirar, comer menos, me pede que pratique todos os métodos e sistemas que ajudarão a minha mente se tornar clara, aguda, sensível.
Tudo isso implica tempo e quando admito o tempo, há outros fatores que intervêm na mente. Se eu tenho de ir daqui até lá, o cobrir essa distância leva tempo. Ao percorrer essa distância, há outros fatores intervindo durante a viagem, de modo tal que nunca chego lá; antes de chegar vejo algo formoso que me entusiasma.
O caminho não é uma senda reta e estreita pala qual avanço; sucedem inumeráveis coisas. Estes acontecimentos, incidentes, impressões, vão mudar a direção do movimento.
E essa coisa que estou tratando de compreender, também não é um ponto fixo.
A: O ponto que não é uma coisa fixa deve ser explorado.
Krishnamurti: Eu digo que minha mente está confusa, perturbada, não compreendo. Você me diz que compreenda fazendo estas coisas. Portanto você estabeleceu a compreensão como um ponto fixo. E ela não é um ponto fixo.
SW: Não é um ponto fixo.
Krishnamurti: Obviamente. Se é um ponto fixo e eu vou até ele, existem outros fatores que intervêm em minha viagem até este ponto, e estes fatores vão influenciar em mim muito mais que o fim para o qual me dirijo.
A: Esse fim é uma projeção da mente que supõe conhecê-lo.
Krishnamurti: Esse caminho não é o caminho em absoluto; primeiro veja, não é um ponto fixo e nunca poderá ser. Portanto, digo que isso é algo totalmente falso.
Então, como esse não é o caminho, e posto que nego toda a coisa, varri um campo tremendo: todas as práticas, meditações, todo o conhecimento. Com que fiquei então? Fiquei com o fato de que estou confuso, de que sou lerdo.
Agora, como é que sei que sou lerdo e que estou confuso? Apenas por meio da comparação, porque sei que você é muito receptivo, e comparando, medindo, digo que sou lerdo. Não comparo, e então vejo o que fiz mediante a comparação.
Comparando, reduzi a mim mesmo a um estado que eu chamo ‘lerdo’, e vejo que tão pouco é o caminho. De modo que descarto a comparação. Sou lerdo então, se não comparo?
Assim é que descarto o sistema, um processo, um fim fixo que você desenvolveu como um meio de esclarecimento através do tempo. Digo que a comparação não é o caminho. Medida significa distância.
SW: Isso quer dizer que esta compreensão não é absolutamente um assunto vitalmente relacionado com a capacidade? Nós começamos pela capacidade...
Krishnamurti: Eu digo que escuto a você, Swamiji, mas que não o compreendo. Não sei o que é que não compreendo, mas você me mostra – o tempo, o processo, o ponto fixo, etc..
Você me mostra tudo isso, e eu o descarto.
O que ocorreu a minha mente então? No próprio descartar, no negar, a mente se tornou menos lerda. A negação do falso clarifica a mente; e o negar a comparação, que também é falsa, aguça a mente.
Em conseqüência, o que me restou agora? Apenas ao comparar-me com você eu sei que sou lerdo. O embotamento existe ao medir a mim mesmo com o que se chama aguçamento, e então digo que não medirei. Portanto, sou lerdo? Abandonei completamente a comparação, e a comparação significa conformidade.
O que restou então? A coisa que eu chamo ‘lerda’ não é lerda, é ‘o que é’. O que me restou ao final de tudo isto? Tudo que me restou é que não compararei jamais. Não me medirei com alguma pessoa que é superior a mim, e não pisarei esta senda belamente projetada para mim. Deste modo descarto todas as estruturas que o homem impôs sobre mim, destinadas a alcançar a iluminação.
Aonde me encontro, então? Começo pelo princípio. Não sei nada sobre a iluminação, a compreensão, o processo, a comparação, o devir. Descartei tudo isso. Não sei. O conhecimento é o meio de ferir-me, e a tradição é o instrumento pelo qual eu fico ferido. Começo com total inocência. A inocência implica uma mente incapaz de ser ferida.
Agora digo a mim mesmo: por que eles não vêm este fato simples de que não há um ponto fixo? Por que amontoam tudo isto na mente humana, de maneira que eu tenha de atravessar por tudo isso, e descartar tudo?
Isto é muito interessante, senhor. Por que passar por todo este processo, se tenho que descartá-lo? Por que você não me disse: não compare, a verdade não é um ponto fixo? Florescerá em bondade por meio da comparação?
Pode-se conquistar a humildade através do tempo, da prática? Obviamente, não. E no entanto, você tem insistido sobre a prática, por que? Quando você insiste na prática, pensa que está se dirigindo para um ponto fixo. Portanto, enganou a si mesmo e está enganando a mim. Não me diz: você não sabe nada e eu não sei nada, averiguemos se todas as coisas que os seres humanos impuseram sobre outros seres humanos, são verdadeiras ou falsas. Eles disseram que a iluminação é algo que deve ser alcançada através do tempo e da disciplina, por meio de um Guru. Investiguemos, descubramos se isto é ou não é verdade.
Por que os seres humanos impuseram sobre outros seres humanos algo que não é verdadeiro? Torturaram a si mesmos, castigaram-se com o fim de atingir a iluminação, como se a iluminação fosse um ponto fixo. E terminaram cegos. Penso senhor, que isso é porque aquele que chamam de ‘o homem errado’ está muito mais próximo da verdade que o homem que pratica para alcançar a verdade.
Um homem que pratica a verdade se torna impuro, um homem assim não conhece a castidade.
Vale do Rishi
23 de janeiro de 1971
do livro: Tradicion y Revolucion
Editora Edhasa
tradução: MST-Jina
Extraído de: http://www.lojajinarajadasa.com/4.h.6.html
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